Capítulo 01
Atravessando o tempo e o espaço, independentemente de gênero ou idade, o encontro de duas pessoas sempre se transformava em um jogo intenso e dramático: não importava se ele havia sido planejado, se era uma simples coincidência ou se a Senhora Sorte estava apenas de mau humor naquela noite.
No instante em que se encontravam, os Deuses podiam sorrir calorosamente ou se virar friamente e se afastar.
Eles se enriqueciam.
Ou saíam do jogo.
Fracasso ou sorte, um novo jogo, onde cada lançamento de dados determinava vitória ou derrota.
Mas para o futuro não há um único caminho; a cada passo, bilhões de possibilidades aguardam. Qual decisão, qual direção seria a correta? Para o jogo, não existem regras definidas. A teoria não ajudaria a vencer o banco. Somente a vontade firme e a ausência de arrogância. Isso é seu, e a partir desse momento, não importa o que você espera ou teme, tenha certeza: o alvo em sua mira mudará constantemente.
Ninguém sabe o que pode acontecer entre duas pessoas que acabaram de se conhecer, mas existe a possibilidade de todas as emoções humanas alegria, raiva, paixão, indiferença se manifestarem, e a cada passo rumo ao outro ocorre uma troca equivalente. Juntas, podem traçar linhas paralelas que jamais se cruzarão ou labirintos complexos que serpenteiam pelos espaços da natureza.
Juventude e vida adulta. Quantas pessoas existem no mundo, tantos modos de descrever a fronteira entre essas duas palavras. Ninguém pode permanecer criança para sempre. Assim, sem desviar os olhos do ponto final que chamamos de “vida”, atravessamos as curvas do tempo, encontramos e nos despedimos repetidas vezes…
…Mesmo que isso desencadeie a inevitável causa e efeito, a subsequente extinção e tudo que essas duas palavras implicam.
Numa noite cinco anos atrás, Riki conheceu Jason.
Riki veio do mundo selvagem das favelas, distorcido e corrompido pela quase total ausência do sexo feminino. Cresceu sem conseguir se livrar de um incômodo constante, tentando acalmar a sensação sufocante de apodrecimento da alma. O peso da realidade congelada se enrolava, envolvendo seu próprio ser, cegando-o e confundindo-o, impedindo-o de abrir a porta para a verdade.
“Um mestiço das favelas não tem nada a perder”, gabava-se.
E então aconteceu.
Nada de especial naquela noite. Midas, como sempre, exalava o calor da luxúria. Como uma imperatriz lasciva governando seu reino das trevas, permanecia um ditador ofuscante da noite. Sua voz sedutora e provocante se espalhava por todos os cantos, atraindo almas enredadas, consumindo o silêncio natural das horas noturnas.
Entre suas armadilhas, portões arqueados, chamativos e iluminados, marcavam o caminho saindo do porto espacial em pleno funcionamento construído para a indústria do turismo, localizados em Sazan (Oitavo Distrito), nas periferias orientais de Midas.
Ninfas nuas adornavam o batente, retiradas de mitos dos Veils. Reinterpretadas segundo as tradições da Nebulosa Salina e a lenda de Midas, os sedutores Veils tornaram-se símbolos de Eros e Karma.
Eram tão belos e realistas que não pareciam simples relevos, mas fisicamente atraentes a ponto de fazer homens pararem e estenderem a mão. Possuíam a pureza das donzelas que desconheciam o pecado e, ao mesmo tempo, a lascívia de meretrizes cujo veneno doce enviaria o coração masculino direto ao Inferno.
Como se inflamasse a chama de seu charme, um arco-íris elétrico cintilante iluminava os relevos em um caleidoscópio de cores. A verdadeira magnificência se agarrava aos desejos escondidos no fundo do coração humano, trazendo-os à superfície.
Claro, ninguém podia atravessar os portões se estivesse armado com pistola ou faca. Cada distrito tinha suas regras próprias, mas o principal ponto de checagem, conhecido como Portão de Midas, pertencia à capital, incluindo completamente os Bairros do Prazer.
No coração de Midas, entre dois anéis concêntricos, ruas grandes e pequenas irradiavam do Complexo de Cassinos, criando feixes intermináveis de luz de neon. Homens e mulheres bem vestidos, jovens e velhos, se reuniam, conversando com vozes calorosas e mantendo bom humor; parecia uma piscina de água cintilante.
Ondas de transeuntes se diferenciavam. Turistas se chocavam e se empurravam impacientemente, indiferentes ao ambiente, correndo atrás de seus próprios desejos.
Um jovem ágil caminhava pela multidão. Ainda imaturo, poderia parecer para um observador casual tão verde quanto uma maçã no início do verão. Mesmo assim, seu porte não inspirava proteção: ele não precisava dela.
Havia nos movimentos fluidos de seus membros, típicos da juventude, e no olhar de desprezo lançado a transeuntes ostentando riqueza, um senso de superioridade.
Não possuía aparência que atraísse encontros fortuitos, mas seu rosto criava uma impressão penetrante, irradiando uma aura única. Seus olhos escuros e arrogantes afastavam as pessoas, iluminando falsamente sua idade. Ele se erguia acima da confusão, perturbando o clima alegre ao redor.
Não emanava ameaça, mas parecia em sintonia com o local, não com as pessoas.
Não estava apenas misturado à multidão; atravessava-a. No meio de conversas vazias e do calor inútil dos turistas descontrolados, caminhava sozinho com passos firmes. Seu corpo esguio parecia esconder uma coluna de aço, uma rocha no meio das ondas humanas.
No mundo do dinheiro, qualquer um poderia comprar beleza e juventude, senão a própria vida eterna. Mas nele havia algo impossível de adquirir: o carisma que o impregnava até os ossos. Pequeno, mas brilhante, seu corpo flexível afastava olhares indesejados e impunha respeito.
Esse era Riki.
Um pitbull da “Trinca”, zona vermelha fervilhando de paixões juvenis. Adolescente líder dos Bisões, notório nas favelas.
Habitantes de Midas e de Cerera (Nono Distrito) se tratavam como serpentes e escorpiões. Para um mestiço das favelas como Riki, isso não era novidade; caminhava por Midas não por lazer, mas por necessidade.
Precisava realizar algo.
Cada noite, a principal passagem para o Complexo de Cassinos se enchia de tipos variados. Fácil localizar na multidão gastadores do Logos de mandíbula caída, ricos de Galaria.
Visitantes e turistas raramente carregavam dinheiro; cartões plásticos enchiam bolsos e carteiras. Serviriam, se não fossem pegos, é claro.
Além de deveres cerimoniais da velha polícia montada, os oficiais de segurança de Midas não tinham charme algum. Os atribuídos aos Bairros do Prazer “os Sombras” eram conhecidos por crueldade extrema.
Turistas noctívagos nem sempre tinham intenções inocentes. Sempre surgiam problemas; o risco de confronto com ovinos desavisados era alto. Enquanto houvesse humanos, havia terreno fértil para pecado e egoísmo o preço de existir como ser humano.
Neutralizar predadores antes que atacassem vítimas era trabalho dos Sombras. Assim, habitantes de Cerera mestiços das favelas e seus companheiros, esquecidos nos registros oficiais não podiam esperar direitos civis ou tratamento humano.
Ninguém saía ileso de um encontro com os Sombras, mas crianças das favelas ainda perambulavam por Midas, jogando um jogo mortal, sabendo o preço de cartões roubados no mercado negro.
Não era só isso. Tensão e risco faziam parte do cotidiano da favela; um rito de passagem, mostrando valor. Crianças eram criadas no Centro de Tutela; meninos, biologicamente incapazes de gerar filhos, eram considerados adultos aos treze e expulsos. Livres para escolher seu modo de vida, mas as portas da sociedade estavam fechadas mais chances tinham de levar um raio que de ganhar a loteria da vida.
Sem cartões de identificação como os cidadãos de Midas, a morte era iminente. O cheiro de apatia e indolência permeava os territórios, contaminando a alma em um mês.
Ele ainda buscava respostas. Vida para ele era simplesmente estar vivo. Roubava cartões, sentindo a excitação que preenche o vazio entre nervos tensos e coração acelerado como beber cerveja artesanal feita em barril. Cada noite em Midas acendia seu fogo interno.
Senhora Sorte sorriu para ele naquela noite. Riki acumulava cartões, mas algo faltava. Por que aquela noite não o satisfazia? Nem o próprio adrenalina da caçada preenchia o vazio.
Então Guy interveio.
— Melhor irmos embora antes que a sorte se vire.
Mas Riki ignorou.
— Mais uma volta.
— Riki, está ficando perigoso… — Guy alertava, prevendo que a maré de sorte acabaria.
Riki entendia: homens que não sabem parar atraem problemas.
Devolveu as cartas roubadas a Guy e seguiu sozinho. A fome interior precisava ser satisfeita; o vazio pulsante exigia algo novo.
Seu olhar caiu sobre um turista comum, excitado, curioso e vulnerável à aura de Midas. Fácil alvo. Seguiu a vítima, mantendo distância, calculando tempo e ritmo.
Quando a euforia tomou conta, alguém agarrou seu pulso.
Merda! Riki congelou. Não… isso não pode estar acontecendo… Pela primeira vez, sentiu medo genuíno.
— Zero pontos pelo estilo. Não estou impressionado. — Voz gélida perfurou sua mente.
Riki engoliu em seco. Todos os pelos do corpo se eriçaram. Ele estava enrascado. E isso era só o começo.
O homem à sua frente era alto, impecável, beleza fria e calculada, quase divina.
— Se é esse o seu jogo, faça uma pausa. Você se meterá em sérios problemas. — Jason Mink.
A multidão comentava, mas ele permaneceu indiferente. Riki, determinado, encarou Jason:
— Se vai me repreender, prefiro ouvir da polícia.
Jason, arqueando uma sobrancelha:
— Cuide-se. Não deixe que isso aconteça de novo.
Partiu sem olhar para trás. Riki, furioso, ficou perplexo: nunca esperava que o homem se retirasse da “briga”.
Observou o brilho dourado de Jason, sentindo que cada passo que dava o aproximava de seu destino. Entrava em um labirinto de desespero, excitação e vergonha.
Seguiu Jason, decidido: Não ficarei em dívida por causa de algum elitista de Tanagura.
Riki reconheceu a ajuda de Jason, sem emoção aparente, como um ato cínico e instrutivo — mas não riu. A lição era clara: cada um se vira sozinho.
Mesmo limitado pelo abrigo da favela, Riki já conhecia seus limites de orgulho e não permitiria que humilhações fossem absorvidas passivamente. Por mais jovem, não engoliria tamanho desprezo sem reagir.
Jason se afastou, indiferente, deixando Riki com a sensação de que havia testemunhado algo além da sorte. A presença de Jason era irresistível, divina, e o mestiço sabia que sua vida acabara de mudar para sempre.
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