Quando você se encontra numa situação em que não consegue andar, mas também não chegou a desmaiar, é mil vezes mais constrangedor do que simplesmente desmaiar.
Depois de ser carregado nos braços por um cavaleiro bonito e ainda por cima ter sido cuidado por ele enquanto eu estava consciente jurei para mim mesmo:
"Nunca mais, em hipótese alguma, vou me forçar tanto durante uma purificação."
" Sempre vou deixar força o bastante para conseguir andar por conta própria."
" Absolutamente."
Depois disso, enquanto fingia estar inconsciente, acabei pegando no sono de verdade e, quando acordei, já era manhã.
Considerando que da última vez eu fiquei de cama por cinco dias, isso já foi um progresso enorme.
Se eu fizer outra purificação, talvez consiga controlar melhor a coisa toda.
Assim que me sentei na cama, silenciosamente, Veerant veio até mim... Os acontecimentos de ontem deixaram um clima estranho entre nós.
Eu não conseguia encará-lo nos olhos.
Enquanto eu permanecia ali, inquieto, comprimindo os lábios, Veerant se aproximou, ajoelhou-se diante de mim e curvou a cabeça. Seus cabelos lisos, cor de trigo, se espalhara à minha frente, revelando o topo da cabeça uma visão que eu normalmente não tinha.
— ...Hã? O que está acontecendo aqui?
Por que ele está se curvando para mim?
— Peço desculpas profundas pelo que aconteceu ontem. Aceitarei qualquer punição.
— Hã? Do que você está falando?
— Desobedeci suas ordens e toquei em você sem permissão.
As palavras dele trouxeram de volta as lembranças de ontem.
Eu havia pedido para me apoiar em seu ombro, ele se recusou e acabou me carregando no colo, estilo “princesa”.
Ok, tecnicamente ele desobedeceu e me tocou sem permissão... mas isso não parece algo que mereça punição.
Veerant provavelmente ficou preocupado ao ver que eu mal conseguia ficar de pé e agiu por conta própria.
Por mais que eu tenha detestado ser carregado daquele jeito, no fundo, eu fiquei grato.
Mesmo que a ideia de um homem de meia-idade sendo carregado nos braços por um cavaleiro bonito seja... um tanto deprimente.
— Não, você acabou me ajudando. ...Mas, se puder, prefiro que evite me carregar assim de novo.
— Foi desagradável para você?
— “Desagradável” não é bem a palavra... Mas você não podia simplesmente me jogar sobre o ombro ou me carregar nas costas?
— Se eu o jogasse sobre o ombro, isso colocaria pressão no abdômen, o que não seria bom para seu corpo. E se o carregasse nas costas, deixaria suas costas expostas e indefesas.
Sério, quem liga para “pressão abdominal” ou “costas indefesas”? Estamos no lugar mais seguro do reino o Santuário Interior e o Quarto Branco, onde só a Santa e seus cavaleiros pessoais têm permissão de entrar.
Já estou começando a suspeitar há um tempo, mas... será que o Veerant não é um pouquinho superprotetor demais?
— ...Deixa eu adivinhar: das outras vezes que eu desmaiei... você também...?
— Sim, carreguei da mesma forma.
Eu sabia.
Já desconfiava.
Só queria não ter confirmado.
Ajoelhado ao lado da cama, Veerant parecia impecável e ainda mais irritantemente bonito.
Seu uniforme azul-marinho estava sem um único amasso, e o cabelo dourado, perfeitamente arrumado.
Já é a terceira vez que sou carregado como uma princesa por esse sujeito. É um fato frustrante.
Não consigo ficar bravo com ele afinal, só estava fazendo o que achava melhor.
Mas, ainda assim, é um pouco irritante.
Movido por um leve impulso de vingança, estendi a mão e baguncei o cabelo dele.
Talvez tenha sido com um pouco mais de força do que o necessário, mas tudo bem eu só estava dando uma boa bagunçada.
Não é como se eu quisesse, de propósito, deixá-lo com o penteado desarrumado.
E definitivamente não é porque eu estava descontando um pouquinho da raiva para me sentir melhor.
Enquanto Veerant permanecia ali, paralisado de surpresa, aproveitei a chance e revolvi seus cabelos à vontade.
A maciez deles me lembrou os cachorros que tínhamos na aldeia, e não consegui evitar um leve sorriso.
Depois de passar vários meses purificando as terras, descansando para recuperar o poder sagrado e purificando novamente, comecei a pegar o ritmo.
Desde então, não desmaiei nenhuma vez e sempre consegui voltar ao quarto caminhando por conta própria.
Ainda adormeço assim que encosto na cama, mas isso é detalhe. O importante é que não fico mais de cama por dias seguidos e isso já é uma vitória.
Graças a todo o poder sagrado (e sangue) que venho despejando nas purificações sem me conter, a corrupção diminuiu bastante.
Aqui no templo eu não sinto tanta diferença, mas dizem que os ataques de monstros pelo reino caíram drasticamente. O povo nota os efeitos e, pelo que ouvi, a Santa está sendo mais reverenciada do que nunca.
Ela já era tida como uma deusa viva... Como é possível sua reputação subir ainda mais?
Só de pensar nisso, dá medo.
— Ainda bem que temos a Emilia.
A grande revelação da nova Santa está marcada para daqui a duas semanas, e aparentemente gente de todo o país está vindo para a capital.
Depois de mais de vinte anos de busca, finalmente encontraram a Santa mais poderosa da história.
As estalagens da capital e até das cidades vizinhas estão lotadas de pessoas que querem vê-la de perto o entusiasmo é inacreditável.
Não é exagero dizer que o país inteiro vai se reunir lá.
Todos esses viajantes vão olhar para o palco com olhos cheios de esperança.
E diante deles surgirá... um homem de quarenta e dois anos vestindo um manto branco.
...Vai ser um desastre.
Um desastre absoluto.
Já consigo imaginar a atmosfera congelando, o ar parado como em temperaturas negativas. Só de pensar, meu estômago se revira.
Sinceramente, graças aos deuses pela Emilia.
— Então... eu vou circular pela capital numa carruagem luxuosa, oferecer orações na praça e abençoar o povo, é isso?
— Sim. Durante todo o percurso, Saint-sama, você estará disfarçado como um dos cavaleiros da Emilia-sama, e permanecerá ao lado dela.
— E eu é que vou ter de fazer as orações e bênçãos, né...
Aparentemente, quando a Santa reza, tudo ao redor começa a brilhar.
Veerant disse que uma luz branca suave diferente da magia comum se irradia de mim num raio de cinco metros.
Ou seja, lá estarei eu, resplandecendo como um farol, enquanto Emilia permanece ao meu lado.
...Não importa o ângulo que se olhe, é uma cena absurda.
Para que as pessoas acreditem que a luz vem de Emilia, vou ter de ficar colado nela o tempo todo.
— Do ponto de vista da segurança, também é melhor que vocês fiquem próximos.
— Ah, é verdade. Assim não precisamos nos separar.
A mera presença da Santa já basta para reduzir ataques de monstros, trazer paz às terras e conceder as bênçãos divinas ao reino.
A magia de cura exclusiva da Santa é tão poderosa que pode salvar até quem está à beira da morte.
Por isso, há muita gente que cobiça esse poder.
E não faltam aqueles dispostos a usar qualquer meio sujo para capturar uma Santa, acreditando que, com isso, seriam invencíveis.
Então, para proteger tanto Emilia, a “falsa Santa”, quanto a mim, o verdadeiro, é melhor ficarmos juntos.
— Mas, cara... vou estar num lugar bem chamativo, hein...
Não sei quantas pessoas vão se reunir nesse evento, mas já sinto o desconforto me cercando.
Não é como se todos fossem olhar para mim, mas ainda assim fico nervoso.
Suspirei fundo, enquanto Emilia revisava os detalhes do evento.
Ela vestia as puras vestes brancas de tecido fino que usará na cerimônia. Seus longos cabelos negros, adornados com ornamentos dourados, a faziam parecer quase divina.
Mas o rosto pálido, quase transparente de ansiedade, me fez sentir uma pontada de culpa.
Vai ser um dia difícil para nós dois.
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